Não Há Motivo para Festa


Começo esse post com um ar de reflexão, pensando até onde a insensibilidade humana consegue ir. O que presenciamos na rebelião ocorrida no complexo penitenciário Anísio Jobim em Manaus, onde 56 presidiários foram brutalmente assassinados por membros de uma facção criminosa nos revela a face insensível da sociedade moderna. 



Hoje, em pleno século XXI, vivemos a era da informação, da tecnologia e do entretenimento; vivemos o ápice da indústria da beleza e do bem-estar. Em nenhum outro momento da história as pessoas viveram tanto e com qualidade de vida. O homem fez coisas que nossos antepassados jamais ousaram pensar, mas tudo isso não nos transformou em seres humanos melhores. Quando nos deparamos com tragédias dessas proporções notamos como ainda somos tão bárbaros e insensíveis.

Estou citando o caso manauara pela sua dimensão e para exemplificar, mas poderia citar a chacina em Campinas ou o atentado em Istambul, ambos ocorridos entre 31 de dezembro e 1º de janeiro, todas cenas de um mesmo filme. Voltando ao presídio. A matança que ocorreu no Amazonas revela a insensibilidade em todos os níveis, desde as autoridades governamentais responsáveis pelo sistema prisional, passando pelos presos envolvidos no motim até chegar à considerável parte da população que defende o slogan: “bandido bom é bandido morto”. Vamos por partes.

Não resta dúvida que o nosso sistema penal não fornece nenhuma condição de reabilitação aos encarcerados. Com isso não estou advogando regalias aos que cumprem pena, mas sim, defendendo que um réu condenado precisa dispor do mínimo de dignidade para ter a possibilidade, ainda que remota de ser reinserido recuperado na sociedade. Sou absolutamente contra a pena de morte, pois sem sombra de dúvidas, com a “eficácia” de nossa justiça muitos inocentes seriam sacrificados, mas sou a favor da privatização dos presídios, como ocorre nos países desenvolvidos.

No contexto de uma administração privada, o preso recebe as condições humanas de cárcere, educação e alimentação necessárias para sua recuperação, bem como passa a trabalhar dentro do complexo para se sustentar e em alguns casos até para o sustento da família. Com essas condições a chance de êxito é bem maior. Infelizmente, em nosso país existe uma indústria macabra que se alimenta no sistema prisional, pois um detento custa aos cofres públicos em média quase três salários mínimos, por volta de R$ 2.400,00, que quase em sua totalidade são desviados das mais diversas formas possíveis, por isso não se busca uma solução para o problema das péssimas condições carcerárias.

Alguns presídios, como esse em questão, tem a administração terceirizada, o que não significa que seja privatizado, mas apenas que o Estado terceirizou a gestão para uma empresa, o que aumenta ainda mais o custo da detenção. A verdade é que pessoas, tanto na esfera federal, quanto na estadual lucram com a superlotação e a precariedade das prisões e isso é extremamente insensível, pois condena de fato todos os apenados à uma vida sub-humana e sem esperança. Assim como na saúde e na educação, aqui a corrupção mostra todo seu poder de destruição. Estes milhares de homens e mulheres, jovens, adultos e velhos viverão como animais e se tiverem a chance de retornar às ruas, grande parte retornará exatamente como viveram no cárcere; como animais.

A face mais cruel da insensibilidade ficou por conta dos presidiários que comandaram a chacina. Cenas terríveis de uma crueldade sem limites; corpos desmembrados e amontoados, cabeças enfileiradas como troféus e a comemoração sádica dos chefes da facção criminosa que vibravam como se fossem vencedores. A que ponto pode chegar um ser humano? Pobres miseráveis, que há muito perderam a esperança de um futuro. O que fazer com essas pessoas? Grande parte da população acredita que eles já não têm mais chance de reabilitação, sendo assim, a melhor saída seria o extermínio. Mas, será que isso não seria o mesmo crime cometido no Anísio Jobim? Será que os papéis não estariam apenas sendo invertidos? Penso que essa não é a solução.

Como cristão acredito no caminho proposto por Jesus. Tais indivíduos devem sim pagar pelo que fizeram, mas precisam ter a possibilidade da restauração, precisam ser tratados psicologicamente, precisam ser alocados em ambientes onde possam trabalhar e produzir o próprio sustento, precisam ter acesso à educação e em muitos casos à profissionalização e acima de tudo precisam ter esperança, que poderia ser proporcionada com a inserção de programas religiosos voluntários, onde o evangelho da salvação fosse compartilhado, o que diga-se de passagem já acontece em muitas penitenciárias. Aqui você talvez me rotule de utópico. Sei que boa parte não se recuperaria, mas tantos outros teriam a chance de uma nova vida.

Enfim, chego ao cidadão comum. Li vários posts comemorando a chacina de Manaus e confesso que até compreendo tais manifestações, pois vivemos reféns da criminalidade, à mercê de toda sorte de violência. Mas questiono: Será que essa é a melhor atitude? Será que se um filho ou um familiar estivesse encarcerado pensaríamos da mesma forma? Mais uma vez afirmo que não advogo à causa de criminosos e nem dos direitos humanos, como estão configurados em nossa nação. Porém, meu sentimento cristão não me permite comemorar a morte de um bandido ou de quem quer que seja. Não podemos nos deixar vencer pelo ódio e pelo espírito de vingança, pois isso não resolverá o problema.

Encerro as minhas palavras, olhando ao meu redor e reconhecendo o quanto nossos dias são maus, muito piores do que podemos imaginar. Tantas coisas terríveis acontecendo no mundo; tanta dor; tragédia, fome, injustiça... Como destaquei acima, o caso de Manaus é apenas mais um no mar de tragédias navegado pela humanidade. Porém, não podemos sucumbir diante do mal, não podemos desistir. Precisamos continuar praticando o bem e possibilitando aos outros novas oportunidades, precisamos continuar acreditando, pois é exatamente a esperança que nos faz seres humanos plenos.



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